O Menino João

17-10-2013 12:15

Não há o que não se perca. Perder-se é qualidade dos grandes, de espírito sagaz. Não se perde por ser fraco, mas por desbravar caminhos intactos. Contudo, se a perca é sinônimo de grandeza, reencontrar-se requer simplicidade. É feito carta de amor engarrafada, entregue às aguas: Ainda que não tenha o caminho traçado, guarda consigo a nobre tarefa de eternizar sonhos, cheiros, rabiscos e laços, até que a sutileza do vento devolva-lhe a segurança da terra. 
Já me vi perdido. Nos sonhos, no jeito, no sorriso. Por instantes, deixei que levassem do meu espírito pintado, o que há de mais precioso na alma de um palhaço: O significado de um sorriso. Pensei que reencontrá-lo fosse antes de mais nada, refazer o caminho por onde estive. Mas não foi... É feito poesia, não se faz com palavras, mas de alma leve.
E foi de peito aberto que um simples brilho no olho, devolveu-me o sentido. Foi com um sussurro no ouvido: Preparava-me para subir ao palco... Como de costume, passei pelas centenas de olhares que nos aguardavam. Um me chamou atenção... Parecia mais vivo e trazia consigo um misto de alegria e esperança: Eram os olhos do menino João. De cadeiras de roda, o brilho lhe saltava os olhos a espera dos seres de vestes coloridas. Durante a apresentação brincou, sorriu e até participou. Parecia não se importar com o que ali lhe diferenciava dos demais. Ao encerrar fomos ao seu encontro. Crescia-lhe o brilho no olho e disse-nos: "Palhaços, vocês são de carne e osso?" e acrescentou "Foi o dia mais feliz da minha vida". Neste instante uma lágrima percorreu meu rosto colorido. Entendi novamente que o sorriso nada mais é do que a felicidade que transborda a alma e escorre pelo rosto, igualando-nos enquanto seres imperfeitos. E que o mundo, principalmente o nosso, torna-se obsoleto quando trata-se de alma. Principalmente quando trata-se de palhaços, aqueles que emprestam os seus sonhos aos demais.